Ponte Vecchio: uma charmosa mistura de estilos e memórias

Tempo de Leitura: 6 minutos

Atualizado em 18/09/2023 por Sylvia Leite

Foto TeeFarm por Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAPouco se fala sobre isso, mas se prestarmos atenção, veremos que a famosa Ponte Vecchio, um dos símbolos da cidade italiana de Florença, e conhecida no mundo inteiro por sua singularidade, nada mais é que uma desordenada combinação de estilos, e, se pesquisarmos um pouco, veremos que ela é composta por pelo menos dois projetos arquitetônicos e inúmeros ‘puxadinhos’. A razão dessa charmosa mistura estética parece estar nas diversas utilizações que se fez da ponte ao longo da história, incluindo sua ocupação por estabelecimentos comerciais tão distintos como açougues e joalherias.Foto idaho6556 do Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIA

Até onde se sabe, a Ponte Vecchio original foi erguida em madeira, na Roma Antiga, provavelmente no século 1 Antes de Cristo. Depois de inundações, e consequentes reconstruções, sobre as quais pouco se sabe, a ponte chegou à sua estrutura atual em 1345. Foi construída em pedra, com três arcos de sustentação, a partir de um projeto arquitetônico de autoria indefinida. A dúvida gira em torno de dois arquitetos: Neri di Fioravanti, a quem se atribui os projetos de algumas igrejas italianas, e Taddeo Gaddi, mais conhecido como pintor. Há quem diga que os dois trabalharam juntos e coube a Gaddi o papel de mestre construtor.

Seja de quem for a autoria, o projeto já trazia originalidade. Foi provavelmente o primeiro no Ocidente a usar arcos rebaixados – um recurso arquitetônico que amplia a largura dos vãos e facilita o fluxo do rio, impedindo que a água e os detritos trazidos por ela se acumulem na ponte e pressionem sua estrutura, causando danos ou mesmo destruição.

Foto Nicola Giordano do Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAOs charmosos ‘puxadinhos’

Foto Monica Volpin do Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAQuase cem anos depois (1442) de construída em sua versão definitiva, a Ponte Vecchio transformou-se no mercado de carnes e de peixes da cidade e isso fez nascer seu segundo fator de singularidade: os ‘puxadinhos’ sobre o Rio Arno.

A mudança dos açougues para a ponte foi determinada pelas autoridades sanitárias a fim de livrar as zonas residenciais do mau cheiro e do rastro deixado pelos açougueiros ao transportar ossos, espinhas e restos de carnes até o rio Arno, onde eram descartados. E foram os açougueiros e peixeiros que construíram, de forma desordenada, e ao modo dos famosos puxadinhos brasileiros, as estruturas que se projetam sobre o rio e dão um interessante volume às paredes da ponte.

Há quem digFoto Monica Volpin do Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAa que os açougueiros precisaram construir essas salas, para abrigar os ambientes de serviço, deixando à mostra no corredor da ponte apenas os produtos já prontos para venda. Outra versão afirma que os ‘puxadinhos’ começaram a ser feitos porque as lojas, que inicialmente pertenciam ao Município e eram alugadas, foram vendidas a seus ocupantes e eles se sentiram no direito de ampliar seus espaços, construindo inclusive quartos, terraços e até mesmo casas completas.

O Corredor VasariFoto Guy Dugas por Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIA

No século seguinte (1565), foi adicionado à ponte mais um elemento incomum: uma passagem elevada por cima das lojas, que faz parte de uma estrutura bem maior denominada Corredor Vasari ou Corridoio Vasariano, como se diz em Italiano. A passagem recebeu esse nome por ter sido projetada por Giorgio Vasari, mas seu verdadeiro dono era o governante da época, o Grão Duque Cosimo I de ‘Medici. O corredor liga o Palácio Pitti (ou Palazzo Pitti), residência da família Médici na época, ao Palácio Vecchio (Palazzo Vecchio) e à atual Galeria Uffizi, onde funcionavam, respectivamente, a sede do poder local e seus escritórios administrativos.

O propósito de Cosimo era poder se locomover entre os três pontos de forma privada, e, segundo se conta em Florença, ele não visava apenas obter conforto e privacidade, mas também proteção pois se sentia inseguro por não não contar com o apoio de uma parte significativa da população, entre outras razões, por ter substituído a República de Florença.

A obra foi concluída nImagem Centro Vasco de Arquitetura - Matéria onte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIAo tempo record de menos de seis meses. A razão da pressa teria sido, principalmente, o casamento de Johanna da Áustria. Cosimo queria impressionar os austríacos com seu corredor elevado, além de garantir a segurança de todos ao transitar pelo centro da cidade. A obra não só impressionou os convidados reais, como seguiu impressionando a todos nos séculos seguintes.

Pode ter sido obra sua, também, a transformação da Ponte Vecchio em um mercado de ouro e de jóias que permanece até hoje, exercendo fascínio sobre os visitantes por reunir de antiguidades aos designs mais modernos e inovadores. Mas isso custou a expulsão dos açougues e peixarias que já ocupavam a ponte há mais de um século.

O motivo da mudança foi o incômodo provocado aos Médici pelo cheiro de carne e de peixe quando eles cruzavam a ponte dentro do Corredor Vasari. Algumas fontes afirmam, no entanto, que essa substituição só ocorreu em 1596, determinada por Ferdinando I, o quarto filho de Cosino.

Outros fatos curiosos da Ponte Vecchio

Foto user32212 por Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIACuriosidades não faltam na história da Ponte Vecchio. Uma das mais conhecidas é o surgimento do termo ‘bancarrota’. Conta-se que na época dos açougues e peixarias, quando um comerciante não conseguia pagar suas dívidas, os guardas quebravam suas instalações e dizia-se que ele teve seu ‘banco roto’, o que em Português acabou ficando banca rota ou bancarrota.

Mais umaFoto DEZALB do Pixabay - Matéria Ponte Vecchio - BLOG LUGARES DE MEMÓRIA história surpreendente: é possível que a beleza e singularidade da Ponte Vecchio a tenha livrado da destruição durante a Segunda Guerra Mundial, quando as tropas nazistas bombardearam todas as outras pontes da cidade. Acredita-se que a ordem de poupá-la tenha vindo do próprio Adolph Hitler, que teria visitado o Corredor Vasari algum tempo antes, a convite do dirigente fascista Benito Mussolini.

Outra curiosidade é o hábito de pendurar cadeados na ponte, especialmente nas grades que cercam a estátua de Benvenuto Cellini – um artista que foi considerado o ourives mais importante de Florença. O hábito é inspirado na crença do amor eterno. Acredita-se que, ao fixar os cadeados, os casais adquirem a garantia de que permanecerão unidos para sempre. Ao longo dos séculos, essa tradição trouxe problemas à administração municipal, que precisava fazer a retirada permanente dos cadeados. A fim de minimizar o problema, foi criada uma multa pesada para quem for pego fixando cadeados em qualquer parte da Ponte Vecchio.

A estátua de Benvenuto Cellini foi feita em bronze pelo escultor florentino Raffaello Romanelli, que se tornou conhecido no mundo inteiro pela autoria de bustos de pessoas famosas. O monumento está localizado na parte central da ponte, no único trecho em que não há lojas e os visitantes podem admirar o Rio Arno.1

Notas

Para saber mais

Ponte Vecchio – Rio Arno – Florença – Toscana – Itália – Europa

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Val Cantanhede
2 anos atrás

Que

Elizabeth Werneck
2 anos atrás

Ah, eu adoro Florença, e a Ponte Vecchio é realmente muito charmosa. Parabéns pelo post e obrigada por compartilhar.

Hebe Carvalho
2 anos atrás

Realmente a Ponte Vecchio é mesmo uma charmosa mistura de estilo e memórias. Sem contar que um lugar obrigatório na linda Florença. Fiquei encantada com cada cantinho e com a vista desse lugar.

sonia pedrosa cury
2 anos atrás

Muito legal, Sylvinha! ótimo registro!

Unknown
2 anos atrás

Que maravilha conhecer a história, "poder viajar". Grata!

Angela Beatriz Camara Martins
2 anos atrás

Que interessante essas curiosidades sobre a ponte Vecchio. Não conhecia a origem do termo bancarrota.

Deyse
Deyse
2 anos atrás

Quanta informação é curiosidade bacana sobre a Ponte Vecchio. Confesso que não sabia detalhes sobre dela. Realmente uma charmosa mistura de estilos e memórias.

maggio
2 anos atrás

Sempre como excelentes matérias.

Marcus Cachucho
2 anos atrás

Belo conteúdo!

Alexandra
2 anos atrás

Adorei saber essas curiosidades sobre a Ponte Vecchio! Essa parte do corredor secreto eu já tinha lido no livro o Banco di Médici, que conta a história da família.